segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Princípios de guerra social no capitalismo

Mene: Burguês safado Vs. Chad Proletário.

Guerra social no capitalismo: definições preliminares


A estratégia nas ciências do conflito é determinada em função do objetivo final contido no programa que os sujeitos buscam realizar. Mas quando se trata de uma guerra social que já existe em ato, onde as condições históricas são a base imediata das quais emergem as premissas do próprio programa, a estratégia passa a funcionar de modo congruente com a situação em que se encontra o movimento social dos grupos antagônicos.

No caso de nossa sociedade capitalista, a luta de classes opõem uma massa de proletários (despossuídos dos meios de produção) contra a burguesia (proprietária dos meios de produção) e seus aparatos de poder (o Estado). A classe dominante já detêm o domínio, portanto sua função no conflito é conservar seu poder dominante, fortificar o Estado, “dividir e conquistar” o proletariado, etc. É claro que isso envolve uma série de contradições internas à própria classe dominante e suas frações. A classe dominada, por sua vez, está submetida à concorrência da força de trabalho que lhe desarticula as forças, mas a própria dinâmica da sociedade de classes constrange e força essa classe a se insurgir contra esse domínio e destruí-lo sem piedade (não reformá-lo, mas sim revolucioná-lo). Quem nega a luta de classes e sua situação radicalizada nos processos revolucionários, jamais compreenderá concretamente as revoluções sociais como partes imanentes da história humana.  Enfim, é daqui que surge a questão do programa revolucionário e a estratégia para sua realização, o qual discutiremos mais detidamente a seguir.

Uma estratégia de revolução social é o resultado da consolidação de um programa autônomo da classe social com capacidade revolucionária. Na sociedade capitalista, trata-se do proletariado e seu programa comunista anarquista. Trata-se de uma consequência lógica do próprio processo da luta de classes como algo que existe socialmente no modo de produção capitalista. Os extremos antagônicos do conflito são forçados a planejarem seus objetivos históricos (e qualquer estrategista sabe que são as extremidades que determinam o que está em jogo num antagonismo). O próprio socialismo/anarquismo/comunismo emerge historicamente como o objetivo final que deriva do interesse material de suprimir o sistema salarial (algo cuja possibilidade implica em abolir as classes sociais, uma vez que o capitalismo tenha subordinado todo o processo histórico anterior às relações mercantis). Esse interesse é desenvolvido no seio da classe proletária, pois é a classe cujo pertencimento histórico não envolve nenhum “enraizamento”, justamente porque é uma classe de “desenraizados” (classe que surge do desmembramento comunitário e, portanto, pessoas com interesse objetivo em reconstruir uma comunidade para viver). Neste caso, uma vez que o proletariado não reivindica nenhum título histórico específico, uma vez que sua humanidade negada se torna aquilo que será afirmado e positivado em sua luta: a comunidade humana mundialmente interconectada é sua bandeira.
Mulheres proletárias agitam a bandeira revolucionária.

Estratégia e tática


É evidente que será necessário empregar táticas de curto, médio e longo prazo, congruentes com a estratégia elaborada. Para caracterizar melhor a relação entre uma coisa e outra, podemos nos apoiar nas contribuições de um militar de nossa classe inimiga: Carl Von Clausewitz.

Segundo Clausewitz, as lutas parciais são chamadas de engajamentos. Estes podem ser pensados por si mesmos, pois são momentos de batalhas específicas durante o conjunto da guerra. No entanto, no antagonismo de classes, as lutas parciais só se diferenciam formalmente da guerra social em ato, pois são parcialidades de um mesmo processo histórico que varia conforme as correlações de forças entre as classes em determinadas conjunturas (em outras palavras: os engajamentos nunca estão dissociados entre si, pois se influenciam mutuamente e fazem parte de um conjunto que os engloba: a guerra social da luta de classes).

Neste caso, planejar e executar táticas em distintas conjunturas históricas expressa o modo adequado de proceder em engajamentos específicos. O resultado geral dessas lutas produz determinadas situações históricas que possuem uma série de possibilidades (ampliadas ou reduzidas em função das lutas anteriores).

A coordenação desses engajamentos de modo a atingir um propósito na luta de classes é a estratégia. O fim da guerra só é uma questão posta ao proletariado: abolição das classes sociais. Para a classe dominante, o interesse é negar a existência mesma de uma guerra e enquadrar seus dominados na democracia, onde todos supostamente participam do “governo da sociedade”.

Ainda conforme Clausewitz: “a tática ensina o emprego das forças armadas no engajamento” e a “estratégia, a utilização dos engajamentos para atingir o propósito da guerra”.

Essas distinções são úteis, desde que não se esqueça que a estratégia deriva de uma determinada doutrina social que orienta a luta geral. A doutrina social que orienta a luta revolucionária do proletariado é o anarquismo, conforme discutimos em nossas: Notas sobre o anarquismo.

A doutrina social orienta a luta geral através de princípios que determinam as formulações estratégicas das táticas de combate a serem utilizadas conforme o programa revolucionário. Os princípios são um conjunto de premissas sobre meios de proceder que estejam de acordo com os fins objetivados (daí a crítica anarquista contra a máxima de que: “os fins justificam os meios”).

Uma doutrina social é construída a partir, em primeiro lugar, das condições gerais da luta de classes (a partir do conjunto de determinações históricas e sociais). Em segundo lugar, a partir da apreensão dessas condições pela consciência revolucionária do proletariado (que vai submetê-las a uma análise crítica). Em terceiro lugar, a partir das concepções gerais da teoria revolucionária, pois as ideias da teoria revolucionária condicionam a proposição de princípios.

Em resumo: 1) a teoria revolucionária estabelece a consciência geral do conflito e exprime os objetivos históricos num programa; 2) a reflexão ética sobre meios e fins estabelece princípios de conduta que se consolidam através de uma doutrina social; 3) a reflexão sobre a realização do programa de acordo com a doutrina estabelecida determina a estratégia (que geralmente deriva suas proposições de invariáveis estruturais mais do que variações conjunturais); 4) a reflexão sobre os engajamentos nas lutas parciais de cada conjuntura estabelece as táticas com os quais os militantes revolucionários devem proceder.

Os quatro pontos acima são uma unidade coesa que é necessário estabelecer para uma luta coerente contra o capitalismo. Cada um deles merece um estudo rigoroso, desde que não se dissociem entre si da unidade que formam conjuntamente.

Por enquanto, as orientações gerais que gostaríamos de estabelecer são estas. São ideias em processo de formação e estão em aberto para discussões e possíveis reformulações em caso de críticas que possam aprimorar nossa reflexão acerca desse assunto.